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"Rapidinha" pornô:

uma discussão sobre conteúdos adultos e seus desdobramentos

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PASME: O PORNÔ NÃO NASCEU ONTEM

   

É isso mesmo que você leu. O pornô não nasceu ontem, nem anteontem. Sequer começou a ser apreciado na contemporaneidade. Originalmente, os conteúdos de cunho sexual eram apropriados como uma forte ferramenta de contestação às instituições soberanas, como é o caso da Igreja e do Governo. Em algumas culturas, inclusive, era comum associar a prática sexual com a crença em forças sobrenaturais. Se pudéssemos voltar na história e fazer uma visitinha em Atenas, perceberíamos um forte culto à nudez: estátuas com corpos esculturais, cenas eróticas espalhadas pelas casas, inúmeras peças fálicas, hinos picantes e várias outras práticas quase inimagináveis (ou veladas) em nossas civilizações ocidentais.

 

Já pensou em um concurso com mulheres nuas, onde os homens avaliavam e davam notas para as “nádegas de Vênus” das participantes (uma espécie de miss bumbum) ? Ou, para os mais influentes, uma sessão no teatro com o enredo de histórias e contos adultos? 

Em uma comédia de Aristófanes, escrita na Atenas clássica, em 411 a.C, a protagonista, uma mulher ateniense, inicia uma greve sexual em prol de uma negociação para o fim da Guerra do Peloponeso. As aliadas, lideradas então por Lisístrata, passaram a estimular os desejos dos maridos, mas acabavam não concretizando o ato sexual em si, deixando-os apenas na “vontade” como uma forma de resistência.

       ALERTA DE SPOILER: No fim, a abstinência passa a ser realidade em diversas outras cidades gregas e as mulheres conseguem instituir novamente a paz. E tudo acaba em pizza! Um banquete foi realizado para comemorar o retorno das mulheres aos seus maridos.

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Na mitologia grega, o pênis ereto era considerado símbolo de sorte. Priapo, fruto da união de Dionísio e Afrodite, que o diga. Ele teria sido amaldiçoado por Hera, a esposa de Zeus, a nascer feio e com uma eterna ereção. Hera não aceitava o fato de Afrodite ter subornado Paris em um concurso de beleza. Priapo, então, foi recusado pelo Olímpio e encontrado pelos Sátiros, as divindades da natureza. A partir dessa união, o menino amaldiçoado passou a ser cultuado como deus da fertilidade, dos jardins e do crescimento.

Alguns homens podem ter o chamado “Priapismo”, uma condição de emergência que pode ser causada por inúmeros fatores, como o uso de medicamentos específicos, distúrbios do sangue, leucemia e etc. E não, a ereção persistente dessa condição nada tem a ver com o desejo sexual!

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AINDA EXISTEM PRIAPOS POR AÍ

A partir do desenrolar das civilizações, a pornografia vem sendo produzida e consumida de diferentes formas. O avanço tecnológico propiciou a instauração de um novo mundo, em que os modelos atuantes na esfera do pornô passaram a ser capazes de disseminar competências adaptativas e possibilidades não antes experienciadas pelo homem.

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Lina Wainberg, diretora de titulação da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana, retoma algumas delas:

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MAS AFINAL, O QUE É PORNÔ?

A palavra “pornografia”, representada na raiz de seu significado apareceu, pela primeira vez, no livro do escritor frânces Nicolas Restif de la Bretonne, denominado “Le Pornographe”, em 1976. Na obra, o romancista propunha, dentre outras questões, a regulamentação da prostituição. Hoje, segundo o Dicionário Aurélio, a palavra refere-se a tudo aquilo que se relacione à devassidão sexual, admitindo um caráter imoral nas mais diversas formas representativas, como a linguagem, as pinturas e as cenas. Essa designação passou a permear o cenário mundial em meados do século XIX, quando as representações explícitas do sexo começaram a provocar sensações físicas para sua audiência (o famoso tesão).

Nesse momento, você pode estar se perguntando: mas, quem dita o que é, de fato, devasso? Bom, essa não é uma discussão tão simples! Isso se deve a diversidade de culturas e hábitos praticados ao redor do mundo. Porém, quando tratamos e pensamos sobre sexo, é preciso retomar as diversas instâncias que fazem parte da civilização, tal como a igreja, a ciência, a medicina, dentre outras inúmeras. Cada uma delas atua de acordo com seus modus operandis. Por exemplo, Michel Foucault analisa, em “História da Sexualidade”, a partir das relações de poder, os discursos voltados à sexualidade no Ocidente, capazes de edificar a heterossexualidade como a atração romântica natural. O filósofo ainda retoma os discursos eminentes na era vitoriana burguesa, como atributos persistentes da repressão e da inibição do sexo, ressaltando a mudança de configuração das práticas ilícitas por volta do século XVII. 

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“Eram frouxos os códigos da grosseria, da obscenidade, da decência, se comparados com os do século XIX.”

 

"O que não é regulado para a geração ou por ela transfigurado não possui eira, nem beira, nem lei. É ao mesmo tempo expulso, negado e reduzido ao silêncio." 

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Charles  Le  Goffic, poeta, romancista e historiador francês, apresenta três distintas formas de erotismo: o sotádico, o sádico e o pornográfico. Essas três definições, segundo ele, estariam, respectivamente, relacionadas aos antigos, aos modernos e aos contemporâneos, sendo complexo esmiuçar o que é ou não erotismo, uma vez que nem toda e qualquer representação do corpo acompanha o mesmo valor social.  No século VI, passou a se listar a luxúria como pecado capital. Para os clérigos, se deixar levar pelos prazeres da carne, desviava os cristãos da vida espiritual. Tempos depois, em 1231, a Inquisição aboliu todas as representações de nudez e sexo, condenando quem desviasse da conduta à fogueira ou exílio. 

Dito isso, fica quase impossível falar sobre erotismos sem analisar as especificidades de cada civilização. É fato que a definição do conceito de pornografia está diretamente relacionada as atribuições históricas inseridas e pautadas em aspectos políticos e, sobretudo, morais de nossa sociedade.

“Mas o essencial é a multiplicação dos discurso sobre o sexo no próprio campo do exercício do poder: incitação institucional a falar do sexo e a falar dele cada vez mais;” (FOUCAULT)

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PORNÔ PRA QUEM?

   

Será que o pornô é feito pra você? 

Voltemos um pouco à história. 

Quando o ensaio “Sexo é política” foi publicado na revista Playboy, por volta dos anos de 1970, alguns assuntos figuravam como debate no cenário estadunidense, dentre eles, as questões relativas a gênero. No ensaio, Gore Vidal, ativista político dos Estados Unidos, destaca a ascensão dos valores conservadores, a instituição das boas práticas e dos bons costumes, além da retomada de debates políticos polêmicos da época, como o aborto e a questão dos homossexuais. Segundo ele, os posicionamentos moralistas estavam muito atrelados às visões conservadoras de poder, nas quais a família se mostrava como um pilar muito importante dentro dessas construções. Como consequência, observava-se um repúdio aos homossexuais, atrelando-os como reflexo da promiscuidade e da ruptura do que entendia-se como família. Evidentemente, as representações acerca destes grupos, seguiam (e seguem) as questões sociais, culturais e políticas a que estavam expostos.

“(...) a transgressão representada pelo sexo homossexual é encenada em uma imensa variedade de posições e situações meticulosamente desenhadas como reprodutoras da violação espetacularizada do tabu.”

(Osmundo Pinho em "Raça Fucker: representações raciais na pornografia gay.")

                                      

Rosa Azul e Preto Ilustrativo LGBT+ Incl

Enquanto o Brasil continua sendo o país que mais mata pessoas trans em todo o mundo, o pornô de transgêneros é uma das categorias mais acessadas pelos brasileiros, tendo uma procura 57% maior do que todo o resto do mundo, de acordo com o relatório de 2018 do PornHub.

ÓDIO E DESEJO

Leticia Balducci, pós graduanda em Sexualidade Humana e proprietária da marca Especialistax

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Os questionamentos acerca das produções pornográficas se intensificam quando desigualdades sociais, como as de gênero, são reforçadas paralelamente com cenas de espancamentos, insultos, tapas, puxões de cabelo e até sufocamento. Lylla Cysne Frota D’Abreu, em uma pesquisa publicada em 2013, afirma que a utilização massiva da resistência simbólica em filmes adultos “ é explicada pelo fato de que homens respondem com maior excitação a cenas onde há resistência simbólica da mulher." Segundo Leticia:

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Ainda vigora no imaginário popular, a ideia de que a pornografia é estritamente consumida por homens. Isso porque, desde os primeiros conteúdos adultos audiovisuais produzidos, nota-se uma predominância de materiais produzidos por homens, o que obviamente, reflete os desejos e fetiches do gênero masculino. Entretanto, a web tem se mostrado como uma ferramenta marcante - e revolucionária - de trocas simbólicas, sendo possível estabelecer nesses espaços, relações e conteúdos dos mais diversos e plurais gêneros, incluindo as produções e representações que envolvem a indústria do sexo e da pornografia. Os modelos atuantes na esfera cibernética passaram a ser capazes de disseminar novas competências adaptativas e novas possibilidades.

O PORNÔ PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES

   

A sexualidade, tal como institui a Organização Mundial da Saúde, refere-se a um conjunto de sentimentos que podem ser expressos através de pensamentos, desejos, fantasias, crenças e atitudes, sendo que sua manifestação pode se apresentar nos estágios mais precoces do desenvolvimento humano. Segundo Leticia Balducci:

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A sexualidade é, sem dúvidas, um dos conceitos primordiais para a construção e fundamentação do desenvolvimento humano, sendo a pornografia, portanto, um mediador presente, cada vez mais cedo - e com mais frequência -, na iniciação da sexualidade na vida dos indivíduos. Seu consumo se estende durante anos e pode ser a única educação sexual que crianças e pré-adolescentes estejam recebendo durante a vida. Jovens passam em média duas horas por semana assistindo conteúdos relacionados à pornografia, isso se reflete em média, a 1.400 sessões pornográficas antes do primeiro ato sexual na vida real.

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Toda essa exposição ao longo dos anos, pode criar uma falsa sensação de conhecimento da realidade, além de reforçar estereótipos e papéis tradicionais de gênero.  Ainda, a pornografia é capaz de influenciar os jovens no momento da formação de suas preferências sexuais. Na mente adulta, essa influência ocorre através de um fator chamado “remodelagem”, capaz de reestruturar o cérebro do sujeito em questão, causando uma eterna frustração sexual gerada pela mudança neuroplástica.

A neuroplasticidade, também conhecida como plasticidade cerebral, refere-se à capacidade do cérebro de ser flexível, mutável e se adaptar às experiências e aprendizados.

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TUDO QUE É BOM VICIA?

   

Do ponto de vista psicanalítico, ao passo que as produções cinematográficas do sexo - ou nas mais diversas formas em que a sexualidade se expressa - se expandem, conceitos perversos podem causar um persuasivo estímulo sexual por vezes reprimido, abrindo espaço para novas fantasias e desejos. Em outras palavras, as representações pornográficas, quando analisadas em esferas sociais, são capazes de aguçar condutas sexuais realizadas a partir de formações reativas, causadas pela explosão dos estímulos provocados por sua exibição. Segundo pesquisadores, os materiais sexuais midiatizados são capazes de provocar mudanças neuroanatômicas no cérebro, diminuindo competências específicas relacionadas ao campo, além de agirem no Sistema de Recompensa  e no Sistema Límbico, o que pode causar uma certa dependência em seus consumidores, como afirma Leticia Balducci:

DO PRAZER AO VÍCIO

Os circuitos neuronais responsáveis pelo querer e pelo gostar funcionam de modo independente. Isto explicaria porque dependentes químicos fazem de tudo para conseguir sua dose diária da droga, mesmo afirmando que não gostam tanto quanto da primeira vez que usou.

(saiba mais)

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Agora, a introdução da pornografia nos ambientes virtuais são apresentados em um contexto no qual a interação, em tempo real, se faz presente, sendo possível a virtualização do indíviduo, a partir de um avatar. Como estão cada vez mais inseridos na teia dos conteúdos adultos, os jovens, mais tarde, sofrerão com o que podemos denominar de “anorexia sexual”. Isso, nada mais é do que a dificuldade de se relacionar sexualmente com outrem real, ocasionando, dentre outros fatores, a queda da libido, dificuldade de ereção, necessidade de novos e extremos estímulos, entre outros problemas, como relata o jornalista Bruno Eclode:

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TÔ VICIADO?

   

Lina Wainberg relata receber, com certa frequência, homens em seu consultório queixando-se do vício em pornografia. Mas é preciso analisar de maneira minuciosa, já que, segundo Lina Wainberg, consumir frequentemente pornografia não é, necessariamente, um sinal de dependência.

A BUSCA POR TRATAMENTO

   

Do mesmo modo que é recente a origem da palavra a qual entendemos como o pornô hoje, o vício também esbarra em diversas controvérsias. Para se ter uma ideia, ainda não existe um diagnóstico previsto e esmiuçado no “Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais”, que se refira ao vício em pornografia como uma patologia. Esse é o primeiro desafio: enquadrar um comportamento dentro de um assunto ainda em construção.

 

Segundo desafio: a pornografia encontra diferentes significados e interferências das inúmeras entidades de poder que compõe uma civilização (igreja, mídia, escola, entre outras). A lógica cristã, por exemplo, é capaz de intensificar, mesmo que indiretamente, a vergonha e o constrangimento de um viciado na busca por atendimento especializado. A prática, de acordo com os preceitos religiosos, fere o ritual de boa conduta e pode gerar um conflito moral na vida do indivíduo.

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Terceiro desafio: algumas ideias atreladas a conceitos machistas vigoram também nesse cenário. O vício pode acometer homens e mulheres. Mas as mulheres são mais subjugadas pela sociedade quando o assunto é liberdade sexual. Se os homens enfrentam a vergonha e o desconforto no momento de reconhecer a necessidade de ajuda, as mulheres, por sua vez, ainda precisam lidar com o “tribunal” da crítica, da condenação e da rejeição.

 

Apesar de tudo, existe tratamento para o vício em pornografia, como afirma Lina:

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PORNÔ ENTRE O BEM E O MAU

   

Mas e agora: a pornografia é vilã  ou mocinha

Essa não é uma pergunta simples, e talvez nem justa, de responder. Isso porque, assim como qualquer outra temática polêmica construída socialmente, o pornô transita em uma linha muito tênue entre o bem e o mau. São duas faces de uma mesma moeda. Sabe aquele ditado que ouvimos de pais e avós: “a diferença entre o remédio e o veneno é apenas a dose”? Bom, é quase isso.

A exposição de conteúdos adultos, sobretudo na era digital, abre espaço para novas configurações e novas possibilidades de aquisição de repertório erótico, sendo um mecanismo importante para indivíduos expandirem seus horizontes sexuais.

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Lina Wainberg

Mas ao mesmo tempo…

PORNOGRAFIA PELOS OLHOS DE QUEM VÊ

   

O que é pornografia pra fulano, pode não ser pra ciclano! Se dermos um Google rápido, encontramos algumas (várias) definições do que é pornô. Segundo a editora mundial de dicionários, Oxford Languages, podemos compreender o conceito como:

material contendo descrição ou exibição explícita de órgãos ou atividades sexuais, com o objetivo de estimular a excitação sexual.

Bruno Eclode

Mas e aí, o que excita a cada um?

Bruno Eclode

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Leticia Balducci   

Pós Graduanda em Sexualidade Humana - CBI of Miami

Proprietária da marca ESPECIALISTAX

Membro da organização Protect Young Minds

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Bruno Eclode

Jornalista

Especialização em Cinema Documentário

Criador de conteúdo

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Lina Wainberg

Psicóloga 

 Diretora da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana

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